terça-feira, 5 de fevereiro de 2008

A ARTE DO PASTOR: CULTIVAR E GUARDAR
A reverência ao Homem
não pode separar-se da reverência
ao que está abaixo dele (a Natureza)
e ao que está acima dele (Deus)”
Goethe





Desde sempre o Homo Sapiens procurou modificar o ambiente a seu favor. Porém, até ao século XIX, a acção do homem na natureza foi relativamente limitada e deixou intacto grande parte do planeta. Em contrapartida, após a industrialização, o homem tornou-se um perigo sério para a natureza e, por conseguinte, para si mesmo.

Actualmente, a humanidade – face ao crescimento acelerado que se tem verificado nos últimos anos – enche o ambiente, no qual vive com as outras criaturas, com os resíduos daquilo que produz e consome, inquinando os elementos que promovem a vida do nosso planeta, sobretudo a água e o ar. Além dessa crise ecológica, deparamo-nos, também, com uma crise energética e de matérias primas.

E eu, como cristão, que reflexão posso fazer neste contexto? Quantas vezes não pronuncio a fórmula confessional “Creio em Deus-Pai, Criador do Céu e da Terra...”? O que queremos dizer quando confessamos que o Universo é Criação de Deus? Qual o nosso contributo e a nossa responsabilidade?


Antes de mais, o Universo é um don de Deus para o Homem, que ama e dá valor à sua Obra: “Deus vendo toda a sua obra considerou-a muito boa” (Gen. 1,30). Mas é, também, missão para o Homem: “...Crescei e multiplicai-vos, enchei e dominai a Terra.”(Gen. 1,28); “...O Senhor colocou o Homem na Jardim do Éden, para o cultivar e para o guardar...”(Gen. 2,15).

Nestas citações, realçamos algumas palavras que consideramos fundamentais: Por um lado, enchei e dominai – o homem que deve dominar e sujeitar a natureza. Não colocamos em causa a subordinação de toda a Criação ao Homem. Por outro lado, cultivar (preparar a terra para que ela produza; educar; conservar; dedicar-se, isto na conjugação reflexa) e guardar (proteger; pastorear), ou seja, o homem é chamado à “arte do Pastor” de que falou Sócrates.

Eis, pois, a nossa responsabilidade sobre o Universo. E é nesta linha que tem de ser entendido o progresso humano.

A Criação não é algo de estático, feito de uma vez para sempre, mas que tem de ser visto na sua dinâmica histórico-social em que o Homem é chamado a exercer o seu papel criador a fim de aperfeiçoar, desenvolver e construir uma sociedade digna de o acolher. Nesta linha, o verdadeiro progresso humano, visto à luz do mistério da Criação, será aquele que permita ao homem o seu desenvolvimento e a plenitude da sua vocação integral. Tal como a Criação, o progresso do mundo está destinado para a felicidade do homem e não para a sua degradação.

O Homem é o Pastor do Universo na medida na medida em que tem de guardar e proteger a herança que recebeu e que por sua vez tem de deixar a outras gerações; é a responsabilidade de não deixar atrás de si um deserto mas um jardim, porque este mundo não é meu nem alguém se pode afirmar como o dono do mundo porque ele é de todos. Por isso, é necessário agir seriamente, em primeiro lugar em relação à geração presente, nomeadamente aquela parte da humanidade com menos recursos e que sofra, em grandes proporções as consequências do problema ecológico e, em segundo lugar, às gerações futuras, investindo na educação, como o mais essencial dos recursos.

É a vida de cada um de nós que está em jogo. É a nossa felicidade que, infelizmente, hoje se joga na roleta do económico que é preciso transferir para a roleta do humano. Enfim, somos chamados à “arte do pastor”: a dominar mas a cultivar e a guardar. O mundo não é só laboratório mas também é jardim; é lugar de recreio e gratuidade.

A educação tem de ajudar o Homem a revelar-se como pessoa, cheia de potencialidades e a manifestar essas potencialidades de modo a que, algumas das grandes questões com que ele se debate sejam, de certa forma, acalentadas: “Quem sou, ou o que sou? Donde venho? Para onde vou?”. Tudo isto deve ser feito em consonância com a realidade das potencialidades do Homem e o próprio mundo envolvente. Desta forma, a educação encontra a sua razão de ser, a sua objectividade, pois, assim, o esforço humano não cai num “sem sentido”.



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