Quem tem passado por aqui deve ter lido algumas rubricas com os títulos "Coração Adolescente" e " A adolescência... o olhar dos pais." Ao ir colocando aqui os textos enquadrados nessas rubricas, tinha em mente um texto lindíssimo que havia lido há tempos e que falava do amor na terceira idade. Pois bem, hoje encontrei o texto e aqui quero deixá-lo. O texto está no inspirado e interessante livro de Rubem Alves, "As cores do crepúsculo, a estética do envelhecer." É uma carta que Dina, uma mulher de 86 anos, escreve ao Rubem e que ele nos dá a conhecer no citado livro e que eu aqui vos deixo um excerto:
"Uma estorinha vivida e presenciada por mim. Era o ano 47. Eu tinha que trabalhar muito para sustentar meus filhos, ajudar, porque o pai deles, não gostava de trabalhar em fábricas, era oleiro, e ganhava pouco.
Até quarta-feira, eu lavava roupas para fora. Passava-as a ferro de carvão. O resto da semana ia fazer limpeza nas casas, onde moravam inglesas e alemãs. Trabalhava às sextas-feiras para uma inglesa, ela tinha oitenta anos, o marido 82. Ela se chamava Miss Car e ele Mister Carr. O nome eu nunca perguntei, era "Miss" e "Mister".
Ele ainda trabalhava na cidade, sempre muito bem vestido, estatura média, e ela também. Ele vinha almoçar, naquela pontualidade britânica, dia.
Ela fazia o almoço. Eu limpava a casa e lavava a roupa, que ela passava sentadinha numa cadeira. Eu arrumava a mesa, guardanapos em argolas de prata e coisas que tais e sempre flores na mesa.
Ele chegava, tirava o paletó, e o colarinho sobressaliente duro qual papelão. Se lavava e os dois iam para a mesa. Depois eu tirava a mesa, isto é, o que havia em cima, servia o cafezinho, e quando ia levá-lo, ela estava sentada no colo dele, e ele a beijava no rosto e em seus cabelos, cabelos que ela os trazia sempre ondulados e ficavam assim agarradinhos como se fossem dois jovens. Eu achava lindo, e me perguntava: Será? Ele ia para o trabalho e ela ficava no portão, ele se voltava e acenava-lhe com a mão, até virar a esquina.
E um dia de manhã, eu arrumando o quarto d'ele, cada um dormia no seu. Aí eu encontrei dois chinelos, mas um era o d'ela.
Eu lhe disse: Miss, aqui tem um chinelo seu e outro do mister. E ela, com aquela carinha engraçada e de quem fôra bonita me disse, no seu português arrevezado: "Nós ainda trocamos chinelos..."
Eu arregalei os olhos e sorri, e vi n'aquela fraze tão natural e tão bela, que o amor, entre aqueles que se amam de verdade, nunca morre. Eu fiquei feliz com a felicidade e o amor que irradiava no rosto d'aquela velhinha simpática."
12 comentários:
Raul,
Que história tão comovente.
O Amor é tão bonito em qualquer canto do mundo, vestido de qualquer cor, raça, religião ou condição social. Em qualquer idade a nossa caixinha de afectos tem sempre o melhor presente para surpreender aqueles que nos querem bem.
Um bom dia do Senhor para si e para a sua família.
:):):)
olá! obrigado pela visita! boa sorte para o seu Mestrado. Gostei imenso do blogue pela riqueza e profundidade. Pela experiência.... diferente! Obrigada!
Raul, tenho saudades do teu Sorriso Imenso. E fizeste-me saudades do tempo em que eu amava assim. Os meus olhos brilham, porque estão húmidos dessa saudade.
É tão importante a gente investir no Amor e começar precisamente por Aquele ou por Aquela pensámos que nunca poderíamos deixar de amar daquela maneira que julgávamos única, inventada por nós e para nós!
Na campa do meu Marido mandei gravar "Felizes os que deixam um sorriso por herança". Isto diz-te alguma coisa? Um beijo da Carmo
E pronto..., não chegava a história linda e comovente do Raul, lá vem a nossa avó africana... transformando em sorriso uma dor maior.
Lágrimas e sorrisos... é a linguagem do coração.
Com um nó na garganta... beijos para os dois.
Mais uma Teresa bonita que entrou na teia. Que bom, Raul, que foi lá buscá-la!
Já tinha lido, de facto é comovente,hoje não há muita gente, a trocar chinelos infeliz-
mente.
Eu por acaso ainda os troco especialmente de noite às escuras,
e não dá muito jeito os tamanhos são diferentes, e já lá vão...
Falando de coisas sérias, Raul já leste o "Diário da Nossa Paixão"
Ainda gostei mais, é maravilhoso!
Comovente, extrordinário também
passado na terceira idade (já vi o filme muitas vezes)Curiosamente a minha filha que é adolescente, já deve ter visto o filme uma dezena de vezes.Se puderes procura, vale a pena.
Bom fim e semana!
E pronto, passei por aqui e já estou de olhos rasos de água...
Thanks.
Carmo avó, mãe, compincha, amiga...marota, tens sempre o dom de mexer connosco! Diz-me muito, muito. E já é muito se isso for a lembraça herança que deixo como marca.
É verdade, Fátima, em qualquer idade, raça, cor... condição social... e temos que ensinar isto aos nossos jovens, para que eles não se enganem a respeito do amor e da vida.
Obrigado, também, pela visita, Teresa. Tu terminaste o teu... eu vou percebendo o que isso é. Obrigado pelo insentivo. E Elsa, a culpa é tua/vossa e ainda bem que sentes/sentimos que é uma mais valia. Mas não é o que somos todos uns para os outros? Cada um com o seu jeito e sabedoria!
Isabel, não conheço o livro nem o filme. Fica a sugestão.
Uma boa semana para todos. Continuem a fazer os outros felizes e não deixem de procurar e investir na vossa felicidade.
Carpe diem por esse rio acima!
queu tô feliz quisto acuntéce munte cumigo e ca nha maria... atão na é assim munte bom? dos xineles é cagente na tróca ca nha maria é pântufas.
catão é do sporte? sé do norte cavia dapoiár o pôrto né? cá da terra á muntes do benfica e muntes do sporte. na vô munte á bola.
goste mêmo é dos putos cá da terra.
um abrace do besberto e da maria.
uma história de amor bem bonita, com troca de chinelos, romântico...
que bom saber que há histórias com razão de ser e acreditar na vida!
beijinhos
Sim ...nós ainda trocamos os chinelos e vamos-nos aquecendo um ao outro...percebe , daquele calor quente, bom, que não sabemos bem de onde vem, onde se instala, mas que só sabemos que é o nosso, de fogueira acesa de uma vida. Entranha-se e fica-se assim agarradinho, no borralho ternurento do quero estar na quentura de ti , enquanto estiver
Sim , trocamos os chinelos, mas ainda gostamos de deixar fresta de janela aberta, para uma leve brisa nos acariciar a pele, nos arejar o desejo de sopro de vida a dois, enquanto não partirmos como ave ou sonho.
Sim , ainda trocamos os chinelos, mas sabe uma coisa Raul? Nunca nos trocamos!!
E.I.,
vieste na hora certa e o teu texto foi a minha oração da noite. Que Deus nos proteja e possamos dizer sempre "nunca nos trocamos". Amén!
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